segunda-feira, julho 31, 2006

Vem...


Vem, serenidade!
Vem cobrir a longa fadiga dos homens,
este antigo desejo de nunca ser feliz
a não ser pela dupla humidade das bocas.


Vem, serenidade!
faz com que os beijos cheguem à altura dos ombros
e com que os ombros subam à altura dos lábios,
faz com que os lábios cheguem à altura dos beijos.


Raul de Carvalho

quinta-feira, julho 27, 2006

Nas tuas mãos deixei o mar
Que me habitava

Nas tuas mãos deixei o olhar
Que se torvava

Nas tuas mãos dexei o gesto
De flores que te enfeitava!...


annadomar






ecos!



Há espaços povoados de palavras

Com as memórias deitadas em descanso

A brisa suave , traz ecos

De outras vidas antigas

Com o ouvido colado à terra

Ouvi o teu respirar

Bem distante

Descompassado do meu!

annadomar

segunda-feira, julho 24, 2006

Diego!


Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar.
Viajaram para o Sul.
Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando.
Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto fulgor, que o menino ficou mudo de beleza.
E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai: Me ajuda a olhar!



Eduardo Galeano- O Livro dos Abraços

sábado, julho 22, 2006

Despida!



Desenhas o tempo em areia

Foge-te entre os dedos

Seguras o passado

Despes-te com o presente,

entre mãos

Esquecida de ti

Procuras esse futuro vadio

Que prometeu estar!...

annadomar

sábado, julho 15, 2006

E se eu te disser...




E se eu te disser...

Que sou um barco que
nunca volta
Cansado, de cascos cobertos
de moluscos
Sem portos seguros, nem
amuradas de gaivotas
para descansar

E se eu te disser...

Que sou um barco que
nunca volta
Porque as rotas foram
trocadas
E o mar se fechou
em mim
E o tempo, esse traiu
as memórias antigas
Com que bordava a proa

E se eu te disser...

Que estou tão cansada
Que já perdi o teu olhar
Com que vestíamos a inocência!...


annadomar

terça-feira, julho 11, 2006


Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio.
Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlacemos as mãos.)


Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e nao fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
Mais longe que os deuses.


Desenlacemos as mãos, porque nao vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer nao gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
E sem desassosegos grandes.


Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre iria ter ao mar.


Amemo-nos tranquilamente, pensando que podiamos,
Se quiséssemos, trocar beijos e abraços e carícias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro
Ouvindo correr o rio e vendo-o.


Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, e que o seu perfume suavize o momento -
Este momento em que sossegadamente nao cremos em nada,
Pagãos inocentes da decadência.


Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-as de mim depois
sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
Nem fomos mais do que crianças.


E se antes do que eu levares o óbolo ao barqueiro sombrio,
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti.
Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim - à beira-rio,
Pagã triste e com flores no regaço.


Ricardo Reis


segunda-feira, julho 10, 2006



Se a eternidade existisse,

ela estaria aqui

A guardar o silêncio

A guardar o amor

A guardar as palavras novas

Com cheiro a lavado...

annadomar

domingo, julho 09, 2006



E ao anoitecer, dançaram

Sem parar

Entontecidas de vinho e

felicidade!....

Pela manhã cairam sem chama...

annadomar

sexta-feira, julho 07, 2006

As amoras!


As Amoras

O meu país sabe as amoras bravas
no verão.
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país,
talvez nem goste dele,
mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o céu é azul.


Eugénio de Andrade ("O Outro Nome da Terra")

Anoitece!


A noite caiu no silêncio da música. A casa arrumada, a roupa dobrada o pijama a cheirar a lavado. Lá fora buzinas ainda tardias e culpadas a cortar o silêncio. A minha vizinha aspira a casa, o cão coça o chão de madeira, a campainha toca, passos apressados, quase ouço o beijo que trocam. É assim que se veste a noite repetidamente, em cada fim de dia. Tão cansado que custa sentir as emoções trocadas como o sono acumulado em alvoradas brancas. Espera-se a quietude do tempo, espalhamos as memórias em sobressalto. O cão ladrou, tenho a certeza!...

Chega o cheiro da maresia nocturna. A saudade arrasta-se em marés sem luz. A dor não é identificada, mas existe, porque se sente. Há vampiros na minha rua, que sugam almas e os sonhos distraídos de solidões, que se juntam na noite.É nesse anoitecer, que mergulho, com a vida a fugir entre os dedos. Desenho gaivotas de costas para o mar – "viver também cansa"!...


annadomar

terça-feira, julho 04, 2006

Entre o cinzento e o vermelho
Uma flor sobreviveu
Ao holocausto dos afectos

annadomar






Entre choupos, percorri
O caminho de regresso ao princípio.
No ar o cheiro a pão fresco
Das manhãs claras
Em que o teu olhar é transparente
E pertence-me!
A casa ainda quieta
Fala de sonhos desta noite
E suspira pelos cantos
Os segredos guardados
Destes momentos únicos
Em que partilhas este espaço
Antes que partas de novo sem culpa
Ao menos guarda o cheiro a pão fresco
Onde tudo começa...

annadomar

segunda-feira, julho 03, 2006

Amo-te!


Ele escrevia em todas as paredes
A mesma frase...
Era o seu primeiro amor
Morria em cada dia por ele
Vivia cada dia por ele
Um arrepio corria-lhe o corpo
Sempre febril

Os seus olhos cintilavam
O coração batia forte
Quando o seu olhar cruzava o dela
Tudo era fogo
O Mundo parava
E ficavam os dois num tempo fora de nós
Foi assim que o encontrei
Da última vez que falamos...

...."ela é mesmo um anjo!"...

Agarrei-lhe a cabeça
Com medo de o perder!

annadomar




A preto e branco , escrevo a noite

O silêncio para o vento

A palavra para o vazio

A dor para o pranto

A luz para o frio

A bicicleta, escreve a quietude

ou a solidão desta noite mais.

annadomar

domingo, julho 02, 2006

UM TEMPO!...



UM TEMPO PARA BRINCAR

UM TEMPO PARA OLHAR

UM TEMPO PARA APRENDER

UM TEMPO PARA AMAR

UM TEMPO PARA DESISTIR!...

annadomar