terça-feira, outubro 31, 2006

Borboletas Brancas!...


As borboletas brancas
de vida tão breve
fogem duas a duas
entre o azul e o verde.
Tão paralelamente
e tão iguais de longe
( uma é a outra, uma é a outra...)
Ambas da mesma forma
e do mesmo tamanho,
ambas com o mesmo ritmo.
( uma é a outra, uma é a outra...)
O ar sustenta-as nos ares,
o ar separa-as nos ares,
como um reflexo na água,
uma é a outra, uma é a outra.
Flores de duas pétalas,
logo de quatro, de oito...
( uma e outra, uma e outra...)
Cada uma agora é dupla,
todas duas são uma...
chegam, juntam-se, afastam-se,
vêm, afastam-se, fogem...
... entre o azul e o verde
todas brancas desfolham-se...
( uma é a outra , uma é a outra...)
e passam de uma a outra,
e depois de uma e de outra
apenas são nenhuma.



Cecília Meireles
Maio, 1961

segunda-feira, outubro 30, 2006

Eis o exercício da paciência!...
Que tanto me faz falta...

annadomar

sexta-feira, outubro 27, 2006

A tua rosa!...



Esqueci-me do dia com sol

Atrás das cortinas densas da alma

Viajei por dentro de mim

Sem portos, sem âncoras

Mar fora!...

Deixei a tua rosa no País da memória

Intacta, viva, deslumbrante...

O tempo queimou o cheiro

Mas a cor do gesto

Ficou para além de nós!...

annadomar

segunda-feira, outubro 23, 2006

É na escura folhagem do sono
que brilha
a pele molhada,
a difícil floração da língua.

Eugénio de Andrade

sábado, outubro 21, 2006


As cores...
Pintam-nos a alma de fresco
Vestem-nos de uma alegria antecipada
Pelas pinceladas, que ainda hão-de vir
Inventadas, novas , acabadas de nascer
É uma relação mágica, esta, que inventa as cores
Vestindo e despindo tudo o que o nosso
imaginário quiser!...

annadomar

quinta-feira, outubro 19, 2006

Eu não tinha este rosto de hoje,
Assim calmo, assim triste,assim magro,
Nem estes olhos tão vazios,
Nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,
Tão paradas e frias e mortas;
Eu não tinha este coração
Que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,
Tão simples, tão certa, tão fácil:-
Em que espelho ficou perdida
A minha face?


Cecilia Meireles

quarta-feira, outubro 18, 2006

Adeus!...


Às vezes tu dizias:
os teus olhos são peixes verdes!
E eu acreditava.
Acreditava,porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.
Mas isso era no tempo dos segredos.
Era no tempo em que o teu corpo era um aquário.
Era no tempo em que os meus olhos
eram os tais peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade:
uns olhos como todos os outros.
Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor...,
já não se passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.
Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.
Adeus


Eugénio de Andrade

terça-feira, outubro 17, 2006

Estas janelas!...



Arde a cor

Neste local mágico

Todas as janelas são inseguras

Quando sustêm seres frágeis

Mas a tranquilidade é tanta

Que flutuam num imaginário

Que apetece pertencer

São estas janelas que limpam o olhar!...

annadomar

As palavras!...




As palavras afunilaram em silêncios

Desenhando cones vazios

Perderam-se entre os dedos

Ou em bocas cerradas

Que não querem sorrir!...

annadomar

sábado, outubro 14, 2006


..."Acerta o passo com o meu
Nesta dança infinita…
Em que me perco em abraços teus"...



Não sabia, que te iria perder tão cedo, mas devia ter desconfiado! Pois então teria dançado um tango diferente, não te deixaria rodar sozinho , colar-me-ia a ti em passos nordestinos pelos salões da vida, que fomos atravessando ao longo de vinte anos, com serões vestidos de palavras carregadas de emoção. Choravas e rias no mesmo tom e era bom e era real! O Outono de há 3 anos, levou-te embrulhado numa tempestade, num turbilhão. Tenho tantas saudades tuas! Perco-me em abraços teus e nas palavras que deixaste escritas nas paredes da nossa memória!...
annadomar


E a noite chega muito de mansinho, rente ao mar, rente ao dia!...

annadomar

sexta-feira, outubro 13, 2006

Um passeio a pé!...

Vinha eu com os meus pensamentos fora do dia passeio adentro, quando de repente uma senhora do meu prédio abordou-me - oh vizinha desculpe mas o que hei-de fazer, acabei de receber uma factura da EDP, que refere que tenho zero euros para pagar e zero euros para receber...a primeira coisa que fiz foi morder o lábio de inveja, pensando cá para comigo eu uma rapariga tão gira, tão cheia de graça recebo da EDP uma carta que não essa e vêm-me esta não inocente como se pensa pôr-me uma dúvida destas...
Mas enfim, vizinho é vizinho e sempre faz bem sermos solidários, faz crescer as pestanas e dá bom dormir. Pensei, pensei e acabei por lhe dizer- olhe dê ao desprezo, esqueça é o melhor! Olhou-me espantada um pouco incrédula até. Mantive-me firme nas minhas palavras e ela lá mudou de tema. Mau Maria! Quem me dera não a ter encontrado ...falou-me que estava doente de baixa há um mês, do marido que também doente não trabalhara, da baixa de salários, das ralações com a vida , com os preços ( malandra zero euros na factura da EDP e a queixar-se-me..), com os filhos, com o prédio. Enfim, uma camioneta de problemas a escorregarem por mim abaixo e eu sem força a fraquejarem-me as pernas e a toldar-se-me o espírito. Cada vez que tentava pará-la começava outra queixa. Cá para mim já não falava com ninguém pelo menos há um mês. Também obrigada chata como ela só pode!... Agora percebo porque quando se cruzam na escada ninguém a cumprimenta. Claro soubesse eu e fazia-me de surda e ceguinha na rua, mas não... Há em mim um espírito samaritano que me irrita, mas tem limites.
Farta de a ouvir, disparo: Oh vizinha ainda sobre a factura da EDP. desde Setembro que pode escolher a empresa fornecedora de luz, caso se sinta usada e mal servida pode mudar é só ler as instruções e subscrever. Olha parece que levou a mal, lá se foi como chegou a falar sozinha...
Aí dei uma gargalhada e pensei que estas modernices de ter que andar a pé porque faz bem à saúde , só dão mau resultado. Contudo vou manter este princípio, mas por outros caminhos!...
E já agora oh senhores da EDP , o que é que eu tenho a menos que a vizinha chata, para não merecer um subscrito igual ao dela?...
annadomar

quinta-feira, outubro 12, 2006

Segue o teu destino!...

Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.

A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós próprios.

Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.

Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada podeDizer-te.
A resposta
Está além dos deuses.

Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.

Ricardo Reis

quarta-feira, outubro 11, 2006

segunda-feira, outubro 09, 2006

Quebrar o gelo!...



Procura-se a palavra exacta

A palavra não usada

Para iniciarmos este diálogo adiado

É um buraco fundo

Onde tudo se perde

As mãos desenham círculos incompletos

Os olhares esvaziam-se de sentido- nunca se encontram!

Não existe amurada em que se descanse o amor

Não existe um tempo de existência

Existe um cais de saudade, onde ancoramos!

Nada quebra o gelo

Apenas o copo...

annadomar

sexta-feira, outubro 06, 2006

O vento na Ilha!...


O vento é um cavalo
Ouça como ele corre

Pelo mar, pelo céu.
Quer me levar: escuta
como recorre ao mundo
para me levar para longe.

Me esconde em teus braços

por somente esta noite,
enquanto a chuva rompe
contra o mar e a terra
sua boca inumerável.
Escuta como o vento

me chama calopando
para me levar para longe.

Com tua frente a minha frente,

com tua boca em minha boca,
atados nossos corpos
ao amor que nos queima,
deixa que o vento passe
sem que possa me levar.

Deixa que o vento corra

coroado de espuma,
que me chame e me busque
galopando eu, emergido
debaixo teus grandes olhos,
por somente esta noite
descansarei, amor meu.


Pablo Neruda

quinta-feira, outubro 05, 2006

Há portas!...



Há portas que só têm luz!...

De resto, são carregadas de silêncios...

Segredos pedidos

Outros tantos desejados

Esta porta, tem luz

Mas no fim é o nada

Um vazio, feito de loucura

Um quarto e outro quarto- vazios!...

annadomar

quarta-feira, outubro 04, 2006

Volante da vida!...


Ao volante da vida
a ânsia de existir
é uma rede a secar
nas águas dum regato,
sede em boca seca
da sua saudade


Fernando Ilharco Morgado

terça-feira, outubro 03, 2006



Perde-se o tempo entre marés

As ondas fazem plissados

A areia esconde-se nesta bravura de mar

É um deslumbramento!

No cais do desejo

Onde descansa o teu olhar

Escreve-se a nossa história

Feita de pregas e folhos

Num colo desprotegido de ventos!...

annadomar