quinta-feira, julho 31, 2008

A hora da partida!...




A hora da partida soa quando

Escurece o jardim e o vento passa,

Estala o chão e as portas batem, quando

A noite cada nó em si deslaça.


A hora da partida soa quando

As árvores parecem inspiradas

Como se tudo nelas germinasse.


Soa quando no fundo dos espelhos

Me é estranha e longínqua a minha face

E de mim se desprende a minha vida.



Sophia de Mello Breyner Andresen

quarta-feira, julho 30, 2008

O gato!...

Deslizando a tarde
Pela preguiça
A brisa suave,
arrasta as palavras
pelas copas
Onde os pássaros
Dão sinais de um
gato, por perto
que arrasta a ma-
treirice em passos
estudados!...

annadomar

terça-feira, julho 29, 2008

Afinal o que importa não é a literatura




"Eu acho que se se é surrealista, não é porque se pinta uma ave, ou um porco de pernas para o ar. É-se surrealista porque se é surrealista!""[o amor] É a única coisa que há para acreditar. O único contacto que temos com o sagrado. As igrejas apanharam o sagrado e fizeram dele uma coisa muito triste, quando não cruel. O amor é o que nos resta do sagrado.""Sou um poeta bastante sofrível numa época em que o tecto está muito baixo."



Mário Cesariny

segunda-feira, julho 28, 2008

Não tenhas medo!...


Não tenhas medo do amor.
Pousa a tua mão devagar sobre
o peito da terra e sente respirar
no seu seio os nomes das coisas que ali estão a
crescer: o linho e genciana; as ervilhas-de-cheiro
e as campainhas azuis; a menta perfumada para
as infusões do verão e a teia de raízes de um
pequeno loureiro que se organiza como uma rede
de veias na confusão de um corpo. A vida nunca
foi só Inverno, nunca foi só bruma e desamparo.
Se bem que chova ainda, não te importes: pousa a
tua mão devagar sobre o teu peito e ouve o clamor
da tempestade que faz ruir os muros: explode no
teu coração um amor-perfeito, será doce o seu
pólen na corola de um beijo, não tenhas medo,
hão-de pedir-to quando chegar a primavera.


Maria do Rosario Pedreira

domingo, julho 27, 2008

Quando corri!...


Quando corri para ti

levei em mim

o fulgor dos tempos idos

um cacho de uvas, segurava

o tempo das colheitas

em que o sol queimava

os beijos caídos

na planície de chão vermelho!...


annadomar

quarta-feira, julho 23, 2008

se cada dia cai!...


Se cada dia cai, dentro de cada noite,
há um poço
onde a claridade está presa.
Há que sentar-se na beira
do poço da sombra
e pescar luz caída
com paciência.

Pablo Neruda

terça-feira, julho 22, 2008

Há tardes!...


Há tardes que morrem aos pés

dos barcos que balançam no olhar.

Uma melancolia extrema agarra-se à pele

Transformando os dias num anoitecer

sereno mas magoado de confrontos.

As horas cruzam-se em passos
rumo ao mar, rumo ao azul
Mas o vazio enche o espaço
das gaivotas em voo curto
Das canas que não recolhem peixe
Mas os barcos, esses balançam no olhar triste
sem retorno, sem um ponto de esperança
Que os faça virar!...
annadomar

segunda-feira, julho 21, 2008

Preciso de alguém!...


Preciso de alguém que me olhe nos olhos quando falo.Que ouça as minhas tristezas e neuroses com paciência.Preciso de alguém, que venha brigar ao meu lado sem precisar ser convocado; alguém Amigo o suficiente para dizer-me as verdades que não quero ouvir, mesmo sabendo que posso odia-lo por isso.Neste mundo de céticos, preciso de alguém que creia, nesta coisa misteriosa, desacreditada, quase impossivel de encontrar: A Amizade.


Que teime em ser leal, simples e justo, que não vá embora se algum dia eu perder o meu ouro e não for mais a sensação da festa.Preciso de um Amigo que receba com gratidão o meu auxílio, a minha mão estendida.Mesmo que isto seja pouco para as suas necessidades.Preciso de um Amigo que também seja companheiro, nas farras e pescarias, nas guerras e alegrias, e que no meio da tempestade, grite em coro comigo:"Nós ainda vamos rir muito disso tudo"Não pude escolher aqueles que me trouxeram ao mundo, mas posso escolher o meu Amigo.E nessa busca empenho a minha própria alma, pois com uma Amizade Verdadeira, a vida torna-se mais simples, mais rica e mais bela...




Charlie Chaplin

sexta-feira, julho 18, 2008

Eric Clapton - Wonderful Tonight





E eram noites e noites, doces e cheias de palavras pelo chão!

quinta-feira, julho 17, 2008

Diz-me o teu nome!...


Diz-me o teu nome - agora, que perdi
quase tudo, um nome pode ser o princípio
de alguma coisa. Escreve-o na minha mão
com os teus dedos - como as poeiras se
escrevem, irrequietas, nos caminhos e os
lobos mancham o lençol da neve com os
sinais da sua fome. Sopra-mo no ouvido,
como a levares as palavras de um livro para
dentro de outro - assim conquista o vento
o tímpano das grutas e entra o bafo do verão
na casa fria. E, antes de partires, pousa-o
nos meus lábios devagar: é um poema
açucarado que se derrete na boca e arde
como a primeira menta da infância.
Ninguém esquece um corpo que teve
nos braços um segundo - um nome sim.
Maria do Rosário Pedreira

terça-feira, julho 15, 2008

Os milagres acontecem!...





Os milagres acontecem
a horas incertas
e nunca estou em casa
quando o carteiro passa.
Hoje, abriu a primeira flor
e eu disse é um sinal.
Olho em volta : estou só
trago esta sombra comigo.


Ana Paula Inácio
(in Vago pressentimento, azul por cima)

segunda-feira, julho 14, 2008

Recordo-te!...



recordo-te a respirar ali
a casa no silêncio
o silêncio em ti
tu em mim
e depois não me lembro de mais nada




Sarah Adamopoulos


sexta-feira, julho 11, 2008

Morre Lentamente!...




Morre lentamente quem não viaja,
quem não lê,quem não ouve música,
quem não encontra graça em si mesmo.

Morre lentamente quem destrói
o seu amor-próprio,
quem não se deixa ajudar,morre lentamente
quem se transforma em escravo do hábito,
repetindo todos os dias os mesmos trajetos,
quem não muda de marca,não se arrisca
a vestir uma nova cor
ou não conversa com quem não conhece.

Morre lentamente quem faz da televisão o seu guru.
Morre lentamente quem evita uma paixão,
quem prefere o negro sobre o branco e os pontos sobre os “is”
em detrimento de um redemoínho de emoções,
justamente as que resgatam o brilho dos olhos,
sorrisos dos bocejos, corações aos tropeços e sentimentos.

Morre lentamente quem não vira a mesa
quando está infeliz com o seu trabalho,
quem não arrisca o certo pelo incerto para ir
atrás de um sonho,
quem não se permite pelo menos uma vez na vida
a fugir dos conselhos sensatos.

Morre lentamente, quem passa os dias queixando-se
da sua má sorte ou da chuva incessante…
Morre lentamente, quem abandona um projeto antes de iniciá-lo,
não pergunta sobre um assunto que desconhece
ou não responde quando lhe indagam sobre algo que sabe.
Evitemos a morte em doses suaves,
recordando sempre que estar vivo exige um esforço
muito maior que o simples fato de respirar.
Somente a perseverança fará
com que conquistemos um estágio pleno de felicidade.

Pablo Neruda

quinta-feira, julho 10, 2008



"Porque eu sou do tamanho do que vejo
e não do tamanho da minha altura..."


Fernando Pessoa"‏

terça-feira, julho 08, 2008

Vestígios!...





noutros tempos

quando acreditávamos na existência da lua
foi-nos possível escrever poemas e
envenenávamo-nos boca a boca com o vidro moído
pelas salivas proibidas - noutros tempos
os dias corriam com a água e limpavamos líquenes das imundas máscaras
hoje
nenhuma palavra pode ser escrita
nenhuma sílaba permanece na aridez das pedras
ou se expande pelo corpo estendido
no quarto do zinabre e do álcool - pernoita-se
onde se pode - num vocabulário reduzido e
obcessivo - até que o relâmpago fulmine a língua
e nada mais se consiga ouvir
apesar de tudo
continuamos e repetir os gestos e a beber
a serenidade da seiva - vamos pela febre
dos cedros acima - até que tocamos o místico
arbusto estelare
o mistério da luz fustiga-nos os olhos
numa euforia torrencial

Al-Berto
Horto de Incêndio

sexta-feira, julho 04, 2008

Perfect Day (Lou Reed)!...

Há dias assimm, quase, quase, perfeitos!...

quinta-feira, julho 03, 2008

Resistir!...





Regressar devagar ao corpo morno

Beber um outro vinho pisado por um astro
Possuir o fogo ruivo sob a própria casa
Dobrar na boca o frio da espora
Calcar o passo sobre lume

Abrir o pão a golpes de machado

Soltar pelo flanco os cavalos do espanto

Fazer do corpo um barco e navegar a pedra


numa chama de flechas ao redor.



Joaquim Pessoa

terça-feira, julho 01, 2008


Vem
Senta-te aqui
fala-me
das últimas nuvens
que atravessaste
do tempo amarelo dos girassóis
que crescem no teu peito
fala-me
da voz dos que partiram
em estações tristes
forradas de adeus
fala-me
das faluas que pairam
em águas transparentes
atravessando as conversas
das tribos entre margens
fala-me, fala-me
da infinitude do teu olhar
que se perdeu depois das marés!...


annadomar