terça-feira, junho 27, 2006

Olhos de lodo!


Sou uma viajante, tenho os bolsos carregados das areias dos desertos que já atravessei. Parei sempre quando a luz se escondia atrás das dunas, marcando os meus sinais para o dia seguinte. Partilhei sempre o pão e o vinho à porta das tendas que me acolhiam. Dei o corpo a beber a muitos outros corpos e de todas as vezes amei e fui amada . A comoção sempre foi o fim destes encontros vestidos de orvalho. Não os esqueço nunca, são as marcas da minha passagem neste pedaço de Mundo.

Hoje desencantada,viajante ainda, mas de bolsos vazios, percorro a melancolia que é circular. Guardo memórias, em silêncios cobertos de uma poeira fina que quase cega. Diria que sou outra de uma parte de mim. Caminho em sobressalto, estou infinitamente triste, enquanto a vida insiste em correr mesmo aqui ao lado com olhos de lodo.

annadomar

segunda-feira, junho 26, 2006

As cores


As cores, brincam em quartos escuros
Quando a casa adormece
No silêncio
Saltam, trocam de lugar
Riem e esburracham-se umas contra as
outras
Adormecem, já de madrugada
Ainda com sono
Partem com a menina das cores
Que todos os dias passa por ali

annadomar

quarta-feira, junho 21, 2006


Roubei-te o tempo ... e parti!

annadomar

terça-feira, junho 20, 2006

A ilha




O mar já não é o mar.
O azul já não é tão azul.
Os olhos têm mais sede de ternura.

O corpo já não é o meu corpo.
O rosto já só é o teu rosto.
A ilha, essa escrevo-a só para ti.



Maria Carlos Loureiro

segunda-feira, junho 19, 2006


Mais tranquila escrevo-te em sintonia com o sol.
Espero-te sem desespero até que o horizonte se funda numa linha agarrada ao mar.
O tempo já não é de cólera!
Encosta a tua cabeça ao meu peito e ouve o mar calmo que se instalou de repente.
Atenta ao sabor salgado que se desprende das ondas
e aguarda o recado urgente do chamamento,
sou eu um anjo que te bafejou a orelha,
não esqueças os recados que te deixei em sonhos.

Adeus, até mais já.


annadomar

domingo, junho 18, 2006


O olhar pode ser um jogo escondido!...


annadomar

sábado, junho 17, 2006


Quando o dia acaba
Com o tempo parado

O teu sopro chega em silêncio
O respirar da água, colado ao corpo
A tua ausência, a tua ausência...
Tão longa, a magoar!
Lanço a rede feita de nadas
Onde invento
Peixes dourados
Que mordem a alma
Assim, vejo na outra margem
O último voo de uma gaivota perdida
Ou ainda, a tua imagem esbatida,
na memória

annadomar

Estrela da Tarde


Era a tarde mais longa de todas as tardes que me acontecia
Eu esperava por ti, tu não vinhas, tardavas e eu entardecia
Era tarde, tão tarde, que a boca, tardando-lhe o beijo, mordia
Quando à boca da noite surgiste na tarde tal rosa tardia

Quando nós nos olhámos tardámos no beijo que a boca pedia
E na tarde ficámos unidos ardendo na luz que morria
Em nós dois nessa tarde em que tanto tardaste o sol amanhecia
Era tarde de mais para haver outra noite, para haver outro dia

Meu amor, meu amor
Minha estrela da tarde
Que o luar te amanheça
e o meu corpo te guarde

Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza
Se tu és a alegria ou se
és a tristeza

Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza

Foi a noite mais bela de todas as noites que me adormeceram
Dos nocturnos silêncios que à noite de aromas e beijos se encheram
Foi a noite em que os nossos dois corpos cansados não adormeceram
E da estrada mais linda da noite uma festa de fogo fizeram

Foram noites e noites que numa só noite nos aconteceram
Era o dia da noite de todas as noites que nos precederam
Era a noite mais clara daqueles que à noite amando se deram
E entre os braços da noite de tanto se amarem, vivendo morreram

Eu não sei, meu amor, se o que digo é ternura, se é riso, se é pranto
É por ti que adormeço e acordo e acordado recordo no canto
Essa tarde em que tarde surgiste dum triste e profundo recanto
Essa noite em que cedo nasceste despida de mágoa e de espanto

Meu amor, nunca é tarde nem cedo para quem se quer tanto.


Ary dos Santos

sexta-feira, junho 16, 2006

As últimas vontades


As últimas vontades



Deixa ficar a flor,
a morte na gaveta,
o tempo no degrau.
Conheces o degrau:
o sétimo degrau depois do patamar;
o que range ao passares;
o que foi esconderijo do maço
de cigarros fumado às escondidas...
Deixa ficar a flor. E nem murmures.
Deixa o tempo no degrau,
a morte na gaveta.
Conheces a gaveta:
a primeira da esquerda,
que se mantém fechada.
Quem atirou a chave pela janela fora?
Na batalha do ódio,
destruam-se,fechados,
sem tréguas,os retratos!
Deixa ficar a flor. A flor?
Não a conheces. Bem sei.
Nem eu.Ninguém.
Deixa ficar a flor.
Não digas nada.
Ouve. Não ouves o degrau?
Quem sobe agora a escada?
Como vem devagar!
Tão devagar que sobe...
Não digas nada.

Ouve: é com certeza alguém,
alguém que traz a chave.
Deixa ficar a flor.

David Mourão- Ferreira

a tarde azul


Enche a vida de enfeites

Desenhando bolas de sabão
A janela é o seu Mundo.
As mãos agarram a vida
Numa tarde azul
Diferente de outras
Não ouve nada
Descobriu o espaço
Onde voam os pássaros!...


annadomar


E de novo partiram,

com o Sul na memória.

Ás vezes, não regressam...

anadomar

quinta-feira, junho 15, 2006


E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente.
Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros.

Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram,
todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas a ilusão de que
tudo podia ser meu para sempre.


Miguel Sousa Tavares

preto e branco



A preto e branco,

Se veste esta solidão

feita de silêncios!...

annadomar



Da pesca trouxe a esperança
Do mar a força de viver
da areia a vontade de se
perder

Esse corpo gingão
Essa gargalhada franca
Os dentes alvos

Trazem marés novas
Notícias boas
Ou apenas o teu sorriso...

Annadomar



Dizem que a noite é serena
que as palavras cansam que o amor
é breve


Dizem que no correr das horas
as páginas fogem e os livros
são escritos.



Maria Carlos Loureiro

terça-feira, junho 13, 2006

O sorriso




O SORRISO


Creio que foi o sorriso,
0 sorriso foi quem abriu a porta.
Era um sorriso com muita luz
lá dentro, apetecia entrar nele,
tirar a roupa, ficar nu
dentro daquele sorriso.
Correr, navegar, morrer
naquele sorriso.

Eugénio de Andrade



( passado 1 ano da sua morte)

segunda-feira, junho 12, 2006

a fonte


Caminho com a música
Colada aos pés
Uma alegria repentina
Assalta-me...
É uma memória fresca
Que chega nesta tarde branda
Em que a sede sossega na fonte


annadomar

terça-feira, junho 06, 2006


Foi para ti que criei as rosas.
Foi para ti que lhes dei perfume.
Para ti rasguei ribeiros
e dei ás romãs a cor do lume.



Eugénio de Andrade

domingo, junho 04, 2006


Nas minhas mãos seguro
O Mundo
Por um instante
Senti
Que nada mais existia
Para além desse
Mundo que és tu

Assim, perdi a lucidez
Pela emoção de te ter
Preso na palma da minha mão
Existes...é tanto!...

Annadomar